Responsabilidade criminal do Governo.
No rescaldo da maior manifestação pós-25 de Abril de 1974, todos se interrogam como podem os sucessivos Governos em Portugal gerir de forma tão desastrosa o país e tratar tão mal a maioria da população sem que exista qualquer consequência ao nível da justiça.
Não podem os membros de um Governo ser responsabilizados perante os Tribunais, civil ou criminalmente, pela gestão que fazem (ou fizeram) de Portugal?
De uma forma simples, não. A Lei nacional não o permite, a não ser que pratiquem algum crime. No entanto, na minha opinião, devia permitir em condições expressamente consagradas nas normas legais. O erro nas previsões não pode justificar tudo. Se os membros de um Governo aceitam que as políticas fiscais mais gravosas apenas atinjam a população mais desfavorecida, deviam ser responsabilizados perante os Tribunais. Se um Primeiro-Ministro, se um Ministro, se um Secretário de Estado ou qualquer outro político com responsabilidades governativas mente ao povo que o elegeu, sabendo que o está a fazer, tem de ser responsabilizado criminalmente.
Pode agora o leitor dizer... “eh pá, que exagero. Assim temos de construír mais prisões”. E terá razão. Infelizmente habituamo-nos a que os políticos mintam, sem consequências (a não ser eleitorais).
Está na hora então de mudar radicalmente a política, os políticos e a forma de governar Portugal.
A Islândia fê-lo. Julgou políticos, banqueiros, responsabilizou os bancos pelas dívidas e não deixou que a sua soberania se perdesse irremediavelmente em troca de um punhado de notas. E... espanto para todos os políticos, está a recuperar economicamente de forma sustentável. E sem exigir sacrifícios desproporcionados ao povo. A recuperação económica em Portugal terá de ser feita também por esta via. A total remodelação da política e dos políticos (principalmente estes) tem de se efectuar, sob pena de se perpetuarem as injustiças sociais, com “o pobre cada vez mais pobre, e o rico cada vez mais rico”. Não podemos continuar a suportar financeiramente políticos e máquinas partidárias que mais não são do que sorvedouros do dinheiro público, ou seja, do dinheiro dos nossos impostos. Cada vez pagamos mais para vêr ministros, secretários de estado, deputados e afins a passear, a fazer negociatas, a acumular salários públicos com lucros privados (de negócios, parcerias e consultadorias pagas pelo Governo ou por empresas do Estado sem concurso público). E tudo feito às claras. E o povo cala e consente. E assim o tem feito durante décadas.
No passado dia 15 de Setembro o povo saíu à rua em grandes manifestações. Várias gerações e vários estratos sociais estiveram presentes. O que parece querer dizer que estamos mais unidos para mudar este estado calamitoso em que Portugal se encontra. Assim espero, apesar de estar convencido que pouco irá mudar. De qualquer forma uma das primeiras alterações de fundo que se deve fazer é responsabilizar civil e criminalmente os detentores de cargos públicos, incluíndo os políticos, governantes, gestores e similares. Uma coisa é errar. Outra totalmente oposta é ser indiferente e mãos-largas para os amigos, conhecidos e familiares com o dinheiro dos contribuintes. E mentir conscientemente a uma nação inteira não pode continuar a ser algo de normal. Tem de ser criminalizado. Não é nada de radical se pensarmos que qualquer um de nós se mentir às Finanças ou à Segurança Social pode responder judicialmente. Porque razão não pode o mesmo acontecer com os detentores de cargos políticos? Estão os “nossos” governantes acima da lei?
Pedro Miguel Branco (Advogado)
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