"...da factualidade provada, constata-se que a arguida, de forma consciente e reiterada, colocou seguramente em risco, de modo relevante, a saúde física e psíquica da ofendida – sua filha menor – tornando-a vítima de um tratamento incompatível com a sua dignidade enquanto ser humano, conduzindo necessariamente os “maus-tratos” infligidos à sua “degradação” enquanto pessoa."
O CASO:
1. A e J casaram um com o outro em 20 de setembro de 1997;
2. São progenitores comuns de M, nascida a 6 de Setembro de 2004 e de V, nascida a 28 de Maio de 2012;
3. A mãe A, o pai J e as duas filhas coabitavam na Rua x;
4. Desde, pelo menos, 2007 a Outubro de 2013, as mais das vezes no domicílio comum, em número não apurado mas em alguns períodos em frequência quase diária, e em contexto não concretamente apurado, a mãe A dirigiu-se à filha M, apelidando-a de “cabra”, “estúpida”, “burra”, “porca” e, pelo menos duas vezes, “puta”;
5. A mãe A, economista e com formação superior, não se coibiu nesse âmbito de atingir o corpo da filha M com pontapés e pancadas com as mãos;
6. Que nesse contexto, de viva voz e com foros de seriedade, a mãe A declarou à filha M “que ia bater-lhe com um cinto, e colocá-la num colégio interno”;
7. No dia 28 de Outubro de 2013, pelas 19h00, a mãe A agarrou e torceu o braço direito da filha M, empurrando-a de seguida contra uma cadeira;
8. Como consequência direta e necessária de tal atuação da arguida (mãe A), a menor M sofreu dores nas zonas atingidas, bem como equimose com três por cinco centímetros na face externa do braço direito, lesão que lhe determinou para cura vinte dias de doença, sem impossibilidade para o trabalho;
9. Ao agir da forma descrita, a mãe A teve o propósito conseguido e reiterado de humilhar e maltratar física e psiquicamente M, sua filha, com quem coabitava, bem sabendo que, por força da sua tenra idade, esta não tinha qualquer capacidade séria de oferecer oposição à atuação da arguida, circunstância de que se prevaleceu para prosseguir a sua acção;
10. A arguida (progenitora de M) agiu sempre livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei;
11. No dia 6 de Novembro de 2013, o pai J saiu da casa de morada de família, levando consigo as duas filhas do casal.
DECISÃO (Por unanimidade dos Juízes):
1. ...da factualidade provada, constata-se que a arguida, de forma consciente e reiterada, colocou seguramente em risco, de modo relevante, a saúde física e psíquica da ofendida – sua filha M – tornando-a vítima de um tratamento incompatível com a sua dignidade enquanto ser humano, conduzindo necessariamente os “maus-tratos” infligidos à sua “degradação” enquanto pessoa.
Estão assim preenchidas das circunstâncias da alínea d) do n.º 1 e do n.º 2 do art.º 152.º do C.Penal;
2. A moldura penal abstracta do crime imputado é de 2 a 5 anos de prisão;
3. Assim, entende-se, nos termos do disposto nos art ºs 70.º e 71.º e 40.º, todos do C.Penal, ser de aplicar à arguida (mãe A) a pena de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período (vd art.º 50.º n.º 5 do C.Penal);
4. A progenitora da menor M foi ainda condenada no pagamento de €5.000 (cinco mil euros) de indemnização a título de danos não patrimoniais à filha menor M, acrescida de juros à taxa legal desde a notificação do pedido até integral e efectivo pagamento.
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02 de Março de 2017.
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